sexta-feira, 1 de julho de 2011

O MACRAMÊ E UMA ANDORINHA de Gabriela Pardim

Entrevistada: Rosângela Ampúdia


A VOZ DO GUETO: Com quem você aprendeu o macramê?
Andorinha: Meu pai que me criou, na verdade o meu avô materno. Na família era chamado de vô Brito, mas eu quando precisava me referir a ele, dizia pai Brito. Foi ele que me ensinou o macramê.

A VOZ DO GUETO: Você se recorda dos momentos que passou com ele?
Andorinha: Na casa em que eu fui criada... a nossa casa. Éramos eu, ele e a mãe Maria. Tinha uma varanda muito gostosa. E tinha assim um pilar, sabe? Ele amarrava as sacolas em pé. Eu tenho procurado por um primo que tem fotos dele amarrando-as, mas nem tenho conseguido... mas enfim... ele amarrava essas sacolas, que ele aprendeu com a mãe dele. Em Minas.

A VOZ DO GUETO:Como era o dia-a-dia com vô Brito?
Andorinha: Ele contava que tinha um tio que tinha uma vendinha, e ele trabalhava nessa vendinha, desde ainda menino. Enquanto ele amarrava a sacola... então... ele fez um balanço pra mim... que ficava perto desse pilar que ele amarrava. Perto tinha o tanque ... de manha era tão gostoso... porque enquanto ele amarrava, eu balançava ... e minha mãe estava muitas vezes no tanque... tinha um quarador em casa... que ela cuidava com carinho... ela gostava de quarar asroupas brancas...

A VOZ DO GUETO: Como aprendeu a fazer as sacolinhas?
Andorinha: Eu aprendi naturalmente, sem sofrimento. Foi engraçado porque na escola quando já na adolescência, eu estudei numa escola, Instituto de Educação de Assis, e era um sistema pluricurricular. Tinha uma cozinha e tinha um salão pra artesanato e uma oficinas para meninos. Eu optava sempre pro artesanato e para a oficina (rsrs). Quando a professora levou aulas de macramê... levou a sacola que ela aprendeu com meu pai.

A VOZ DO GUETO:Então, você se saiu muito bem nessas aulas de sacolinhas de macramê?
Andorinha: Ela ia enrolar muitas aulas nisso, e eu entao saquei a dela e ensinei pro pessoal e ate fiz pra quem não conseguia fazer... porque fiquei chateada com ela por não ter falado que aprendeu com vô Brito, dizendo que tinha aprendido com a vó dela. Mas nem quero mais falar sobre isso.

A VOZ DO GUETO: Alguém mais da família sabe tear em macramê?
Andorinha: Vô Brito ensinou pra um filho dele, o tio Zezé, mas isso bem antes de mim. Ele também fazia e presenteava como o meu pai. Incrível que esse meu tio fazia aniversário no mesmo dia que o meu pai: 3 de junho. Ambos falecidos. E eu fui a única pessoa que deu continuidade... depois de muito tempo... tô voltando a fazer as sacolas...

A VOZ DO GUETO: Você disse que as sacolas eram presentes?
Andorinha: Era uma fila de espera e era engraçado, porque ele presenteava as netas filhas e quando casavam era o presente mais pedido...

A VOZ DO GUETO: Como é para você, ensinar outras pessoas a fazer o macramê, em um tempo que é tão pouco valorizado o trabalho artesanal?
Andorinha: Olha, quando eu dei as oficinas dos Sescs... a maioria das pessoas que faziam era da terceira idade e vinham com muita saudade falar do macramé. Tinham sempre historias parecidas com a minha...algumas vinham pra relembrar o amarrio.Era assim que meu pai falava. É gratificante.

A VOZ DO GUETO: Tenho uma curiosidade. De onde surgiu o macramê?
Andorinha: O macramé tem origem no mar. Os marinheiros, começaram a amarrar para passar o tempo e criaram peças que acabaram sendo presentes para as mulheres que encontravam em terra.

A VOZ DO GUETO: Pelo o que você me contou, o macramê na sua vida vai além de um trabalho artesanal. Me parece um elo com seus ancestrais. Como é ter essa ancestralidade nas "pontas dos dedos"?
Andorinha: É uma energia interessante. Porque é como manter viva a imagem de pessoas queridas e também de momentos vividos. Eu sempre digo que foi a maior herança que meu pai me deixou. Enquanto algum filho discutia meus direitos legais, eu que ignorei esses direitos fiquei com a parte melhor dos seus bens.

A VOZ DO GUETO: Você pretende ensinar seus netos como vô Brito te ensinou?
Andorinha: Pretendo sim. O ponto básico eu ja ensinei para os meus filhos... mas por enquanto eles usaram para fazer bijouterias. A sacola mesmo ainda não consegui passar. Mas pretendo sim. Só não tenho certeza de qual deles dará essa continuidade... embora desconfie.

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